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13 de agosto de 2011

Vida no sertão

Eis que ela vem e logo perdemo-la ali. Eis que ela vai e brevemente virá em regresso. Dizem por ai, mas precisamente pelas campinas de Araxá, que essa tal é a última a ser morta, embora poucos já viram, um dia, essa bendita morrer. Uns dizem que constataram sua morte na rua dos conselheiros, mas provas do fato não há. Outros dizem que poucos dias depois de ter sabido da  morte da dita cuja, a viram perambular pelas ruas do sertão. Se morre, não sei, mas que vive, é indubitável.

A vida no sertão é difícil. Marias e Severinas com seus bacuris no colo, magrelos, famintos, com bicho do pé e barriga d'água. Sentadas na soleira ficam, esperando os Joãos e Josefos chegar. Embora a notícia de antemão se anuncia (por horas labutei / descanso não encontrei / fartura também não achei), elas ficam lá sentadas, junto com a maldita que nunca morre e só serve pra remoer as emoções mais do que abaladas pela tragédica realidade que ali se passa.
Ora, esperança, não vês que aqui não tens lugar? Olha ao teu redor, esperança, vês se há condições de, nesta cena, atuar? há crianças famintas, mães que choram, homens tristes e animais semi-mortos, e porque tu ainda vens, criando no coração dessa gente um sentimento de que "as coisas podem sim melhorar"?

Enquanto a maldita esperança arruma as trouxas para dali arredar o pé, uma mãe grita da porta, com seus olhos fundos, mas convictos, dizendo algo assim: "Vai não, esperança, fica! há vida no sertão. Os meninos me disseram que, embora a fome exista, há vontade de viver. Eu, que embora entristecida, fatigada e em farrapos, sei que se tu for embora, ai mesmo jeito não teremos!" no que diz a esperança: "Ora, mas não achas que só sirvo para iludir-vos?", no que, sem tempo, é objetada: "Nada disso, esperança! é contigo que, de manhãzinha, na minha reza a Santo Alguém, me apego com firmeza, olhando para o meu ontem, lembrando das aflições e olhando para o meu hoje, vendo pela janela que o Sol voltou de novo e acreditando que neste dia novo, as coisas podem dar certo e os meninos podem viver mais um bucado".  

Cleison Brugger

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